📌 Os Sentidos e a Teoria Crip

por Sara Wagner York

Aula de Português para falantes de língua inglesa a partir dos conceitos CRIP.

Resumo

Crescemos aprendendo sobre os cinco sentidos tradicionais: visão, audição, tato, paladar e olfato. Mas, e se existirem mais? A Teoria Crip desafia as concepções normativas de deficiência e corporeidade, questionando os discursos biomédicos, sociais e culturais que marginalizam corpos “desviantes”. Inspirada pela Teoria Queer, ela propõe uma visão crítica sobre acessibilidade, autonomia e as políticas do corpo. Ao expandirmos a ideia dos sentidos, podemos repensar como as deficiências e as capacidades são moldadas culturalmente. Nesta aula, exploraremos as bases teóricas da Teoria Crip, autores centrais, e como ela se aplica à pesquisa e ao ativismo.

Autores Principais

📚MOREIRA, Martha Cristina Nunes; DIAS, Fabiana Santos; MELLO, Anahi Guedes de; YORK, Sara Wagner. Gramáticas do capacitismo: diálogos nas dobras entre deficiência, gênero, infância e adolescência. Ciência & Saúde Coletiva, v. 27, n. 10, p. 3949–3958, 2022. Disponível em:scielo.br . Acesso em: 14 mar. 2025.

📚 Robert McRuer — Crip Theory: Cultural Signs of Queerness and Disability
📚 Eli Clare — Exile and Pride: Disability, Queerness, and Liberation
📚 Alison Kafer — Feminist, Queer, Crip
📚 Rosemarie Garland-Thomson — Extraordinary Bodies: Figuring Physical Disability in American Culture and Literature
📚 Lennard J. Davis — The Disability Studies Reader

Roteiro da Aula

🔹 Sentidos Físicos (Corpóreos)

1. Tato — Relação com o toque e as superfícies. O capacitismo impõe barreiras físicas, mas também simbólicas, como o medo de tocar corpos desviantes.
2. Paladar — Ligado à experiência sensorial do sabor, podendo ser modificado por deficiências neurológicas ou metabólicas.
3. Olfato — Memória e identidade podem ser associadas ao cheiro, mas nem todos têm essa percepção sensorial desenvolvida.
4. Visão — A experiência da cegueira ou baixa visão desafia a ideia de um mundo construído visualmente como norma.
5. Audição — Surdez e variações auditivas mostram que a comunicação não é apenas oral, mas também visual e tátil.

🔹 Sentidos da Vida e Movimento

1. Equilíbrio (Vestibular) — Relacionado à estabilidade corporal. Corpos Crip podem ter diferentes formas de equilíbrio e locomoção, desafiando padrões normativos.
2. Cinestesia (Propriocepção) — Capacidade de perceber o próprio corpo no espaço. Questões neurológicas, como paralisia cerebral, trazem outras formas de experiência cinestésica.
3. Termocepção — Sensibilidade à temperatura. Algumas condições médicas alteram essa percepção, criando desafios na interação com o ambiente.

🔹 Sentidos Cognitivos e Emocionais

1. Sentido da Vida — Uma percepção subjetiva do bem-estar. A Teoria Crip questiona a narrativa de que corpos com deficiência têm menor qualidade de vida.
2. Sentido do Pensamento — Relacionado à compreensão lógica e racionalidade. O capacitismo desvaloriza neurodivergências, como autismo e TDAH.
3. Sentido da Linguagem — Comunicação vai além da fala; libras, escrita alternativa e outras formas de expressão são igualmente válidas.
4. Sentido do Eu dos Outros — Percepção da presença e intenção do outro. Muitas vezes, corpos Crip são tratados como invisíveis ou infantilizados.

🕒 1ª Parte — Fundamentos da Teoria Crip

🔹 Origens: Conexão entre Teoria Crip e Teoria Queer
🔹 Deficiência além do modelo médico: Crip como identidade política
🔹 Cripistemologia: Modos alternativos de conhecimento a partir da deficiência

🕒 2ª Parte — Corpos, Normatividade e Resistência

🔹 A crítica ao capacitismo e a “obrigação de cura”
🔹 Interseccionalidade: deficiência, gênero, raça e classe
🔹 Performance e dissidência: corpos trans, travestis e corpos Crip

📌 Gramáticas do Capacitismo

O capacitismo estrutura a sociedade através de normas que marginalizam e excluem pessoas com deficiência, definindo-as a partir de um ideal de corpo funcional e produtivo. Essas normas são reforçadas por discursos médicos, culturais e institucionais que tratam a deficiência como algo a ser superado, corrigido ou eliminado.

A gramática do capacitismo pode ser observada em diversas esferas:

🔹 Na linguagem: Expressões como “superar a deficiência” ou “ser um exemplo de superação” reforçam a ideia de que corpos não normativos são inadequados.

🔹 No espaço urbano: A falta de acessibilidade em transportes públicos, prédios e eventos evidencia a exclusão estrutural.

🔹 Na cultura pop: Representações de personagens com deficiência frequentemente os retratam como figuras trágicas ou super-humanas, reforçando estereótipos.

🔹 Na política e no trabalho: A exigência de padrões produtivos ignora diferentes formas de existência e restringe oportunidades para corpos Crip.

O estudo da Teoria Crip desafia essas normas e propõe novas formas de pensar corpos, subjetividades e acessibilidade, valorizando a diversidade e a autonomia das pessoas com deficiência.

🕒 3ª Parte — Aplicações e Discussões Contemporâneas

🔹 Acessibilidade radical e autonomia
🔹 Cultura pop e representações Crip

🎤 Reflexão Final

🔹 Como os 12 sentidos nos ajudam a repensar o corpo e a (d)eficiência?
🔹 Como a sociedade constrói normas baseadas apenas em alguns sentidos?
🔹 Como expandir nossa percepção sobre acessibilidade e diversidade sensorial?

Vocabulário de Tradução (Português — Inglês)

Conceitos-chave

• Capacitismo — Ableism
• Deficiência — Disability
• Normatividade — Normativity
• Corpo desviante — Deviant body
• Acessibilidade — Accessibility
• Autonomia — Autonomy
• Interseccionalidade — Intersectionality
• Identidade política — Political identity
• Obrigação de cura — Cure obligation
• Resistência — Resistance
• Representação cultural — Cultural representation
• Performance de gênero — Gender performance
• Travestilidade — Travesti identity
• Transgeneridade — Transgender identity
• Discurso biomédico — Biomedical discourse
• Epistemologia Crip (Cripistemologia) — Crip Epistemology
• Percepção sensorial expandida — Expanded sensory perception
• Refere-se à ideia de que os sentidos vão além dos cinco tradicionais e podem ser ampliados para incluir outras formas de percepção.
• Sensibilidade tátil — Tactile sensitivity
• Relacionada à percepção e reação ao toque, especialmente importante em contextos de deficiências que alteram a forma como o corpo interage com o ambiente.
• Sinestesia — Synesthesia
• A condição ou experiência onde a estimulação de um sentido causa uma percepção em outro. Por exemplo, ver cores ao ouvir música.
• Propriocepção — Proprioception
• A percepção do corpo em relação ao espaço e aos próprios movimentos, crucial na discussão de deficiências motoras e percepção corporal.
• Interocepção — Interoception
• A percepção dos sinais internos do corpo, como fome, sede, dor, ou o batimento cardíaco, uma área que é pouco explorada nas normas tradicionais sobre os sentidos.
• Epistemologia sensorial — Sensory epistemology
• A forma como o conhecimento e a compreensão do mundo são mediados e construídos a partir dos sentidos, especialmente com a proposta de uma Crip Epistemology, que subverte as normas dominantes sobre os sentidos.
• Cognitivo-sensorial — Cognitive-sensory
• Refere-se à interdependência entre processos cognitivos (pensamento, julgamento) e a percepção sensorial, importante ao discutir como os corpos deficientes processam e experimentam a realidade.
• Hiperacusia e hiposmia — Hyperacusis and hyposmia
• Hiperacusia: Hipersensibilidade auditiva.
• Hiposmia: Diminuição do sentido do olfato. Esses termos ajudam a descrever variações nos sentidos que não se encaixam nas percepções normativas e são fundamentais na Teoria Crip.
• Corporeidade expandida — Expanded corporeality
• A ideia de que o corpo não é limitado aos sentidos convencionais e que podemos conceber múltiplas formas de corporalidade, especialmente em contextos de deficiência.
• Neurodivergência sensorial — Sensory neurodivergence
• A variação nas formas como o cérebro processa estímulos sensoriais. Este conceito se conecta diretamente com a crítica à normatividade da percepção sensorial.
• Capacidade perceptiva e estética — Perceptive and aesthetic capability
• Refere-se à maneira como as deficiências sensoriais ou cognitivas podem redefinir a estética e as capacidades de perceber e interagir com a arte, a cultura e o mundo.
• Desvio sensorial normativo — Normative sensory deviation
• A quebra das normas sociais e culturais sobre como os sentidos devem funcionar e como a deficiência pode ser uma forma de desvio criativo ou libertador.